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Eu, mulher negra, RESISTO!


21 de março, é o “Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial”. A data foi escolhida em memória ao episódio conhecido como “Massacre de Sharpeville”. Em 21 de março de 1960, na cidade de Sharpeville, África do Sul. Estudantes realizaram uma manifestação, contra a Lei do Passe, que cerceava a livre circulação da população negra para determinados lugares. Os negros,maioria absoluta da população sul-africana, recebiam do governo o pior tratamento: as piores escolas, os piores hospitais, as piores residências e grande exploração no trabalho, pois eram considerados pelas leis do Apartheid como seres inferiores em relação aos brancos. Durante o protesto, o exército atirou sobre a multidão matando 69 pessoas e ferindo outras 186. O fato "abalou" o mundo e a data foi instituída para a reflexão sobre a luta do povo negro contra a discriminação.

Sharpeville é aqui.

No Brasil 83 negros são mortos por dia, não precisam fazer nada, reivindicar nada, só precisam ser pretos. Sob o olhar da nossa policia, que a ONU inclusive reconheceu que é assassina e precisa acabar (leia aqui) os negros brasileiros são geneticamente perigosos e por isso eles atiram primeiro e pensam depois. E esse pensar depois não significa refletir sobre o crime, mas pensar na desculpa que vão dar caso alguém questione o motivo de ter atirado. Quase sempre eles conseguem convencer as pessoas que aquele preto morto ali, era um bandido, mas as vezes não tem como convencer as pessoas do erro, como no caso Amarildo, ou no Caso da Cláudia onde fica muito aparente a c culpa da policia nos assassinatos. E, mesmo depois de todos terem entendido que o assassinato foi gratuito, ainda há uma manobra gigantesca pra que esses assassinatos sejam ligados ao racismo, porque no Brasil há racismo mas não existem racistas. E se não existem racistas, não há como criminalizar e penalizar o ar, o vento. Com isso os jovens negros, esses 83 que os números oficiais nos dizem, seguem sendo assassinados, e o que podemos entender hoje é que o Brasil sabe que os jovens negros tem mais chances de morrer, reconhece que eles morrem por serem negros mas não se importa com isso, visto que pouco faz para que os racistas sejam incorporados na humanidade e deixem de ser um mito sem identidade social, profissão, CPF e titulo de eleitor.

Acredito também que o genocídio preto acontece de maneira mais ampla, e mata também os negros e negras que permanecem respirando, mas perdem a vida quando são impedidos de ser quem são. Afinal, como ser uma pessoa, um cidadão ou cidadã social quando não tem as condições mínimas pra isso? Ser uma pessoa quando não se tem direito sobre seu corpo, cultura, história e identidade?

Como ser negro sem poder ter um corpo negro? Como existir sem assimilar todas as coisas ruins que acontecem com pessoas parecidas com você? Como explicar pro seu filho que não, ele não é igual as crianças que ele vê na tv?

Nós negros morremos quando as portas são fechadas, quando o futuro é só uma massa cinza e disforme que tira do nosso campo de visão qualquer dignidade possível porque a luta diária é para sobreviver, viver é outra coisa. Na luta pela vida, nós chegamos sempre por ultimo e toda essa exclusão racista acaba nos levando ao álcool e outras drogas, na tentativa de fugir da realidade que é cruel. As drogas sempre são oferecidas para as populações oprimidas, seja pro trabalhador ficar mais tempo acordado gerando mais lucro pro patrão, ou pro jovem negro ficar paralisado entre uma sensação de conforto mental e uma depressão terrível quando volta pra realidade, depressão esta que também paralisa. Navegar pelo mundo confortável e voltar pro mundo original de diversas ausências é um convite, quase um empurrão pra voltar pro mundo mágico e confortável que as drogas trazem. Assim vemos muitos dos nossos perdidos no álcool, cocaína e tantos outros tipos de controle possível. Estão mortos, o racismo matou.

O suicídio é outro que anda ali, de mãos dadas com o racismo. Só ano passado, recebi a noticia de 3 jovens negros de diferentes lugares do Brasil, que se suicidaram, dois porque não aguentaram pressões racistas depois de entrar na universidade, e outro não deixou nenhuma carta, mas os amigos disseram que ele estava triste porque não aguentava mais ser negro. Quantos outros negros se suicidam e não sabem dizer que foi por causa do racismo?. Estes tipos de assassinatos que não entram nas estatísticas do genocídio da população negra, e coloca toda a culpa do fracasso social sob nossas costas. Quantas vezes nós não ouvimos que a culpa é nossa? Faltou esforço, faltou vontade, faltou coragem. Mas quem é que tira nossa vontade? Quem é que criminaliza aquele olhar do branco quando nos diminui, exclui e humilha? Como podemos criar forças infinitas pra viver num Estado racista? As vezes não podemos, e a culpa não é nossa. Por isso enquanto temos forças é preciso falar, escrever, demonstrar e tudo o que for possível para documentar nossas denuncias de racismo. Depois de muitos anos de luta do movimento negro, uma micro abertura do Estado foi aberta, então vamos alargar essa fissura ampliando o debate para pensar em novas politicas publicas que possam acolher melhor a população negra, porque o racismo ampliou suas formas de assassinato.

Hoje é um dia de reflexão, que seja um dia dos pretos fortalecerem, que seja um dia para os brancos pensarem onde guardam seu racismo e que todos nós possamos pensar como podemos contribuir pra melhorar esse quadro generalizado de mortes com recorte racial, sexual e de gênero. Também é um dia para pensarmos, o que o Brasil esta fazendo efetivamente pra diminuição do racismo? Qual a orientação dada para os veículos de comunicação sobre o assunto? Existe algum tipo de preparação sobre questões raciais que seja obrigatório para pessoas que trabalham com o publico? Existe algum tipo de filme, cartilha ou alguma introdução ao assunto que esteja disponível nos órgãos públicos que informe sobre as leis anti racistas e/ou direitos de pessoas negras? Na saúde, qual é a orientação sobre pessoas negras? Será que o Estado brasileiro ainda nos vê como todos iguais, apesar de ter reconhecido legalmente por meio de ações afirmativas que somos diferentes?


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